03 setembro 2010

Metade do meu céu...

Sombria a tarde cai, delegando na noite a obscuridade plena…
Uma gota de orvalho percorre a janela vagarosamente deixando para trás um rasto que seca por si.
Lá fora, os meus olhos apagam a focagem das luzes que se perdem no horizonte…
O silêncio é interrompido pelos sons do mundo que acalmam o sossego que ali se prostra.
Longe vai a vontade indefesa de cair no esquecimento das palavras de um livro, que me libertam as emoções…
Uma vela solta o calor de uma qualquer fragrância doce e frutada, iluminando o abecedário cruzado daquelas páginas romanceadas.
O instante remete-me a um embalo de tempo pesaroso.
Semicerram-se as pálpebras e, os contornos da história atravessam o meu inconsciente…
Reinvento personagens, procuro um espaço e um tempo coincidentes…
Atraio palavras para diálogos apaixonados…
Seduzo a natureza a tornar-se a mais harmoniosa…
Crio o tempo das possibilidades sem sombra de interdição.
Mobilizo os afectos… numa chusma de incapacidades para amar.
Com sentidos tão surreais quanto dispersos, que ficam no livro de apontamentos, para as notas de rodapé.
A árvore genealógica não tem raízes, tem inúmeras cicatrizes em relevo…
Entrelaçadas por rancos floridos de esperança e frutos cor de pecado…
As ervas daninhas formam relvados de jardins imprevistos, numa natureza viva e em absoluta comunhão…
O amor incorre na dúvida de se reflectir na vida dos personagens, como se necessário fosse um argumento ou contrato para amar… Nos encontros e desencontros que uma vida vivida é capaz de proporcionar…
A noite cai na perversidade da madrugada e acordo…
Acho que sonhei muito… ou passei por várias imagens fotográficas de intensidade variável…
Nem sempre nos abrimos ao exterior, aos impulsos e desejos mais encobertos…
A vergonha, a negligência, a culpabilidade compensa-nos os sentidos, anestesiando o que deixa de ser a nossa verdade…
Cedo à vulgaridade da letargia do sono e uma vez mais intensifico a disponibilidade para sentir…
No céu, desfaço um aglomerado de nuvens e escrevo o meu nome…
E no limite, aguardo que se complete… a outra metade do ‘meu’ céu...

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