20 março 2008

A(ti)ngida pelas palavras...


Encaro as palavras como um pedaço de mim. A interpretação que delas faço vai muito mais além daquilo que o seu significado pobre e frágil transmite a ouvidos ou olhos desatentos.
Já me proibi de escrever ou tentar representar em meras palavras imbuídas de trejeitos, sensações compensatórias que em mim se desvanecem por senti-las tão veementemente.
Chamo de lúgubres, as imagens que povoam a solidão de um corpo. Fazem-me lembrar as paisagens submersas num inconsciente denso, meticuloso e escuro de incompreensão.
Uma penumbra obsessiva.
Um abismo pessoal constante.
Um absolutismo que, macambúzio, vagueia só no narcisismo inconsequente do desejo.
Tatuo máscaras duma personalidade não assumida por falta da energia e da luminosidade dum existencialismo profícuo, com tendência ao retrocesso cultivado.
Não se pode exigir o que nunca se teve.
Gosto de apagar-me a cada dia que passa para renascer entusiasticamente de seguida.
É gratificante ouvir este silêncio em tom de melodia que tem tanto de discrepante como de obtuso…
Parece que a nossa ténue existência é em vão quando o paradoxo se transforma na questão do desaparecimento.
Quais as formas da minha ausência, do meu fim?
A água cai e faz uma visita guiada pelo meu rosto perdendo-se, sem rasto, no infinito de dúvidas expiatórias.
Regresso, tolerante aos vocábulos que dou vida e que são excepcionalmente usados.
Descrevo, por exemplo, a imagem dum arco-íris prostrado num verde genuíno e eloquente…
O trivial não me interessa. Está absorto de mim…
Atinges-me?

1 comentário:

Misantrofiado disse...

Compiladora, diria eu… essa tua mente desperta (muito mais que a minha) e sedenta.
Escreves bem, muito bem mesmo. Não apenas devido à ausência de erros ortográficos ou de pontuação deficiente, não… escreves muito bem porque tens plena consciência de que afinal de contas, o que mais importa é sentir. Escreves muito bem porque tens coragem, uma audácia ou… um animo particular que com o qual, pessoalmente, não me sei relacionar.

“Gosto de apagar-me a cada dia que passa para renascer entusiasticamente de seguida”

Gostas? Conheces alguém que gosta? Será de alguma forma, um lugar comum?

Surpreende-me, o cosmos que sei existir por detrás dos teus olhos. Pouco importa o nome que as constelações têm, quando a sua luz brilha a uma distância indiferente à nossa existência.
Tu… atinges e toleras ser atingida.

Eu gosto realmente de me anular… na certeza de que o fim não existe.

A palavra une aquilo que tudo o resto separa e divide.
A(ti)ngido pelas palavras.